A lesão hepática induzida por drogas (DILI, sigla em Inglês) é uma injúria das células do fígado que pode variar desde alterações assintomáticas de enzimas hepáticas (AST, ALT, Fosfatase Alcalina e Gama-GT), até quadros de hepatite crônica ou aguda, com evolução para falência hepática e necessidade de transplante de fígado. Neste grupo de drogas não estão incluídos apenas medicamentos, mas também fitoterápicos, homeopáticos, suplementos alimentares e os chás.

 

A DILI é a principal causa de insuficiência hepática aguda (hepatite fulminante). As mulheres são mais acometidas que os homens por mecanismos hormonais e também porque tomam mais medicamentos e fórmulas, muitas vezes sem necessidade. A incidência anual é de 1 caso a cada 10 mil habitantes, porém acha-se que este número é subestimado pois muitos casos não são diagnosticados ou registrados. A lesão pode ser dependente da dose da substância (ou seja, quanto maior o consumo, maior o risco), entretanto a injúria pode surgir por um outro mecanismo, chamado idiossincrásico, que pode acontecer em qualquer momento do uso da droga e não podemos prever.

 

As substâncias frequentemente associadas à DILI são:

  1. Antibióticos: Amoxicilina-clavulanato, nitrofurantoína, isoniazida e sulfas;
  2. Anti-inflamatórios/analgésicos: paracetamol, diclofenaco, nimesulida, cetoprofeno, naproxeno;
  3. Produtos herbais/chás (incidência crescente): erva de São João, chá verde, cavalinha, cardo do visco, garcínea, hortelã dos açores, erva de São Lourenço, óleo de poejo, celidônia (erva das verrugas), erva de São Cristóvão (cimicífuga), chaparral, kava-kava, picão, boldo, helitrópio (tromba do elefante), comfrey, gynura (velodo-roxo), óleo de cártamo, suco noni e outros produtos herbais, inclusive os de marca;
  4. Anabolizantes/suplementos/termogênicos/pré-treinos (aceleram o metabolismo);
  5. Outros: alguns quimioterápicos, anticonvulsivantes, anestésicos inalatórios, medicações para hipertireoidismo. Obs.: Medicamentos para hipertensão arterial e diabetes causam menos que 5% dos casos.

 

Nos Estados Unidos, o paracetamol é a principal causa de lesão hepática tóxica, mas os produtos herbais estão em segundo lugar, chegando até a 16% dos casos. Esses dados não podem ser ignorados. A ideia de que um produto “natural” não vai fazer mal ao nosso organismo não é tão verdadeira como nossas avós pensavam. Na América Latina os casos publicados estão associados mais frequentemente à amoxicilina-clavulanato.

 

A DILI muitas vezes é assintomática, com alterações apenas nos exames de sangue. A presença de sintomas já pode sugerir uma DILI grave, com necessidade de internação hospitalar. Esses podem ser icterícia (olhos amarelados), fraqueza, mal-estar, náusea, vômitos, dor abdominal, diarreia, febre. Em casos mais graves pode haver alterações do nível de consciência e sangramentos espontâneos.

 

A melhor prevenção contra a DILI é não usar medicamentos desnecessariamente. Fórmulas “milagrosas” para emagrecimento ou hipertrofia muscular (às vezes até prescritas por profissionais de saúde) podem trazer sérias consequências para o indivíduo. O fato de ter exames de fígado normais antes de ingerir essas substâncias não isenta o risco de a DILI acontecer. Além do mais, os chamados “hepatoprotetores” geralmente usados nessas fórmulas carecem de evidência científica comprovada.

 

Referências Bibliográficas

  1. Hassan A & Fontana RJ. The diagnosis and management of idiosyncratic drug-induced liver injury. Liver International. 2018; doi: 10.1111/liv.13931
  2. Garrido-Gallego F, Muñoz-Gómez R, Muñoz-Codoceo C, et al. Acute liver failure in a patient consuming Herbalife products and Noni juice. Rev Esp Enferm Dig. 2015; 107 (4): 247-8
  3. Real M, Barnhill MS, Higley C, et al. Drug-induced liver injury: Highlights of the recent literature. Drug Saf. 2018; doi: 10.1007/s40264-018-0743-2
  4. de Ataide EC, Reges Perales S, de Oliveira Peres MA, et al. Acute liver failure induced by Carthamus tinctorius oil: Case Reports and literature review. Transplant Proc. 2018; 50 (2): 476-477
  5. Bessone F, Hernandez N, Lucena MI, et al. The Latin American DILI Registry Experience: A Successful Ongoing Collaborative Strategic Initiative. J Mol Sci. 2016; doi:10.3390/ijms17030313

 

MARLONE CUNHA – CRM 126.444 SP

GASTRO-HEPATOLOGISTA